O grande escritor britânico Gilbert Keith Chesterton escreveu uma série brilhante de histórias curtas sobre o pároco Brown, que gostava de ciência forense. Este humilde padre investigava casos criminais, porém mantinha a compaixão e compreensão com relação à culpa.
Em um certo episódio, padre Brown dá um conselho a um indivíduo culpado que subiu até à torre da igreja. Ele lhe disse: “Sabe, pode ser perigoso quando um indivíduo se coloca acima dos outros e se considera melhor. Até orar nessa posição pode ser perigoso. As pessoas boas que se permitem ter uma opinião muito boa de si mesmas logo começam a menosprezar os outros e a julgá-los. Não demora muito, começam a sentir-se à vontade para diminuírem os outros verbalmente, e logo sentem-se à vontade até mesmo com atos criminosos de violência.”[1] Mas a humildade é a mãe dos gigantes, e pode-se ver muitas coisas maravilhosas no vale, quando se está no seu devido lugar.” Depois disto, o Padre Brown diz ao homem que o que sabe pode permanecer confidencial, mas pede que ele se arrependa sinceramente e se entregue.
Na série, o padre Brown é retratado como um bom exemplo de aproveitar ao máximo uma posição humilde na vida e ser contente e útil. Ele não tem carro, e geralmente é visto sorrindo pedalando sua bicicleta. Se os outros o insultam, ele mal se altera, e muitas vezes responde com um simples elogio ou aponta algo pelo qual ambos podem ser gratos. Ele apenas faz cada dia o que acredita que deveria fazer.
Seu olhar atento para resolver casos criminais é aguçado por um passatempo favorito: ler mistérios de assassinato. Outros tentam persuadi-lo a permanecer estritamente nas atividades tradicionais de um pároco. Ele cuida bem dessas coisas, mas sabe no fundo que deveria se envolver nos assuntos sérios para solucionar crimes. Seu interesse se torna parte de sua vocação, seu nicho, permitindo-lhe corrigir alguns erros que vê ao seu redor. O padre Brown também reza para que situações injustas sejam descobertas. Ele toca “o segundo violino” em relação ao inspetor-chefe, cujo cargo e responsabilidade é investigar os crimes locais. O inspetor constantemente se ressente pelo padre ter se intrometido em suas investigações. Mas o padre Brown é educado e obedece ao inspetor chefe e não toma qualquer mérito pela solução dos mistérios, porém retorna repetidas vezes, e prova ser indispensável.
Deus deu a cada um de nós o nosso lugar e propósito. Talvez um número maior de pessoas encontraria profunda realização na vida se aprendesse a aproveitar ao máximo a sua posição e se equipasse para fazer o melhor que pode onde quer que se encontre.
Não há nada de errado em aspirar sermos bons naquilo que fazemos e recebermos reconhecimento por isso, mas podemos desanimar e ficar descontentes se menosprezarmos nosso próprio lugar na vida e ansiarmos por uma posição aparentemente mais importante. Com certeza há muitos indivíduos que se destacam em posições de grande utilidade ou proeminência. Mas a maioria preenche um lugar que seria considerado mais comum e corriqueiro. No entanto, cada um de nós recebe habilidades ocultas e valiosas que podem ser desenvolvidas nas circunstâncias onde nos encontramos. E quando aceitamos nossa situação e fazemos tudo o que podemos, muitas vezes desenvolvemos esses talentos ocultos ou anteriormente adormecidos, e podemos usá-los para ajudar os outros, o que também nos traz um sentimento de satisfação e realização. Virtude e profundidade de caráter também são formadas dessa maneira. Todo mundo gosta de ver pessoas felizes com a sua sorte na vida, sua ocupação, sua casa, e entusiasmadas em manter o seu quinhão e ambiente o melhor possível, não importa quão “rotineiro” possa parecer.
Algumas pessoas sabem exatamente o que querem fazer e quem querem ser desde muito jovens. Contudo, uma grande quantidade de jovens precisam encontrar seu caminho e escolher uma ocupação, e muitas vezes isso significa começar pequeno e aprender com o tempo. A pressão dos colegas, a cultura deste mundo e o coração humano podem contribuir para a pessoa menosprezar o seu lugar e posição quando é mais comum e modesto, mas Deus não faz isso.
A Bíblia tem muitas pessoas desconhecidas que se sobressaem do lugar comum, personagens chave para a concretização de grandes eventos. A criada de Naamã foi quem mencionou onde seu mestre poderia encontrar cura para sua lepra. E depois que Naamã visitou Eliseu, o servo dele foi quem sugeriu que seu mestre simplesmente obedecesse ao que Eliseu lhe disse: lavar-se no lamacento rio Jordão, em vez de ir a um dos grandes rios de sua terra natal.
Jesus elogia as pessoas fiéis. “Sobre o pouco foste fiel, sobre muito te colocarei; entra no gozo do teu senhor.”[2] “Esta pobre viúva deitou mais do que todos os que deitaram na arca do tesouro.”[3]
Nosso lugar na vida pode não corresponder a um grande e lucrativo rendimento, nem sermos o centro das atenções, mas torna-se um lugar muito especial e de profunda realização quando damos prioridade ao que é prioritário. Então, para encontrarmos o nosso lugar especial, nosso nicho especial na vida, podemos abrir mão de buscá-lo como prioridade na vida. E, em vez disso, nos dedicarmos a obedecer ao que Jesus disse que deveria ser prioridade máxima: saber priorizar e cumprir o primeiro e maior dos mandamentos de Deus, que é amar a Ele de todo o nosso coração, alma, mente e forças, e amar o próximo como a nós mesmos.[4] Quando nos comprometemos com isso, os toques e a orientação do Seu Espírito se tornam mais evidentes, E à medida que os seguimos, descobrimos um nicho que talvez nunca teríamos encontrado por conta própria. Onde quer que Ele tenha nos colocado neste mundo, e seja qual for o período de tempo, nós aceitamos como nosso lugar, e com a Sua ajuda, aprendemos a torná-lo melhor — como fazia o padre Brown.
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